Doença do refluxo gastroesofágico (DRGE)

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Quase todo bebê regurgita, certo? A gente até usa um termo específico pra isso que é golfar (ou gorfar). Pois é, o trabalho do médico é descobrir se essa regurgitação está dentro da normalidade ou se ela passou do que delimitamos como normal.

E o mais interessante é que o mais importante para definir isso não é quantas vezes o bebê regurgita por dia. Mesmo porque se o bebê regurgita e nem liga, fica feliz depois disso não é um sintoma pra ele, certo?

E vamos lembrar que o paciente é o bebê, então quando ele está incomodado é que é o problema. Pensando assim, os bebês que gofam muitas vezes ao dia mas estão bem, sem irritabilidade, crescendo e se desenvolvendo não estão doentes.

E quando pensamos que o bebê tem uma doença? Quando ele apresenta sintomas relacionados a regurgitação:

  • Baixo ganho de peso
  • Irritabilidade excessiva
  • Dificuldade para dormir
  • Dificuldade para mamar
  • Engasgo
  • Recusa alimentar
  • Tosse
  • Arqueamento das costas

Todos esses e outros sintomas podem estar associados à doença do refluxo, mas eles não precisam estar todos presentes e nem existe nenhum deles que feche sozinho o diagnóstico. Além disso, crianças sem a doença de refluxo podem apresentar esses mesmos sintomas mas em grau menor. O que eu quero dizer com isso? Que se a regurgitação pode ser uma doença ele deve ser avaliado por um médico para que o diagnóstico seja feito corretamente e o tratamento também.

O diagnóstico na maioria dos casos é clínico, isso quer dizer que uma consulta bem feita com as perguntas corretas e um exame físico adequado podem sim confirmar ou excluir a hipótese de DRGE. Entretanto, alguns casos podem precisar de exames complementares, mais uma vez só a análise específica do caso do seu bebê pode nos dizer se ele precisa ou não fazer algum exame.

Na doença do refluxo os sintomas raramente começam antes da primeira semana de vida ou após os 6 meses.

Quais exames podem ser feitos? Eles definem o diagnóstico?

Vários são os exames que podem ser solicitados pelo seu médico e comentarei alguns deles.

Ultrassom de abdome: Esse é o exame que eu mais recebo no consultório e muitas vezes ele me deixa em uma situação complicada.

Já entendemos que existem 2 situações que acontecem, o refluxo fisiológico (não é doença) e a doença do refluxo. Então vamos dizer que seu filho foi lá e fez o exame e nesses 10 minutos em que o exame foi feito ele apresentou 3 episódios de refluxo mas não tem nenhum sintoma? Eu diria que ele não tem a doença.

E agora vamos pensar no outro extremo, uma criança muito sintomática mas que não apresentou nenhum refluxo durante o exame: eu diria que ela tem doença. Nesse caso teríamos uma criança não doente com exame alterado e uma criança doente com exame normal… Por isso é que o objetivo do ultrassom não é fazer diagnóstico e sim descartar uma alteração na anatomia do bebê que chamamos de estenose hipertrófica do piloro. Essa alteração nada mais é do que uma alteração na junção do esôfago com o estômago. Em resumo, seu filho pode ter que fazer um US durante uma investigação de DRGE mas ele não é um exame que confirma ou exclui sozinho o diagnóstico.

A mesma coisa podemos dizer sobre os exames de raio X em que o paciente precisa tomar um contraste antes, os chamados raios X contrastados. Esses exames também são úteis para avaliação da anatomia do trato gastrointestinal.

Há um enorme número de outros exames que podem ser realizados durante a investigação, tanto a realização quanto a interpretação devem ser cuidadosamente feitas pelo médico assistente da criança.

E o tratamento?

Feito o correto diagnóstico partimos para o tratamento, lembrando que tratamento não é sinônimo de uso de medicamentos.

A primeira linha do manejo de crianças com DRGE inclui medidas como: avaliação de frequência e volume da alimentação. Muito cuidado aqui com as crianças em aleitamento materno, nesses casos o manejo deve ser muito bem alinhado para o uso correto do termo livre demanda.

Para crianças que já estão em uso de fórmula infantil o uso de fórmulas espessadas está indicado, lembrando que o aleitamento materno NÃO deve de forma nenhuma ser substituído pela fórmula espessada. Ainda falando em leite materno, as diretrizes não recomendam fórmulas caseiras para espessar o leite materno e nem as fórmulas infantis (uso de farinhas, por exemplo).

Outro tema muito comum porém controverso é o uso de materiais para elevar a cabeceira dos berços e aqui eu faço um alerta:

O Guideline não recomenda a elevação da cabeceira ou deitar a criança de lado em bebês dormindo pelo risco aumentado de morte súbita. Bebês com ou sem refluxo devem dormir de barriga pra cima em berço sem elevação.

TEM VÍDEO NO INSTA SOBRE ISSO: Refluxo: doença ou fisiológico?

Em crianças acordadas e sob supervisão há uma fraca recomendação de elevação do berço e decúbito lateral esquerdo.

Caso as medidas iniciais não deem resultados ainda podemos fazer um teste com a retirada da proteína do leite de vaca em mães que estão amamentando ou a mudança da fórmula infantil para crianças que não se beneficiaram das fórmulas espessadas. E o que o leite tem a ver com o refluxo? Há uma associação da alergia à proteína do Leite de vaca com

Mas e os remédios?

Aqui eu já começo dizendo que a Sociedade Européia de Gastropediatria sugere que o uso de medicações seja feito apenas pelo gastropediatra, evitando assim a prescrição desnecessária dessas medicações.

Quando necessário o tratamento o uso de inibidores de bomba de prótons (omeprazol, esomeprazol) deve ser feito criteriosamente e pelo menor período possível.

Além disso, recomenda-se:

  • Não utilizar domperidona ou metoclopramida no tratamento do refluxo
  • Não utilizar alginatos e antiácidos rotineiramente.

O uso de medicamento não é “brincadeira” então deixo esse tema para ser discutido em consulta.

Fonte: “Pediatric Gastroesophageal Reflux Clinical Practice Guidelines: Joint Recommendations of the North American Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition and the European Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition” Disponivel gratuitamente, na integra no link: https://www.naspghan.org/files/Pediatric_Gastroesophageal_Reflux_Clinical.33.pdf

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